segunda-feira, 25 de novembro de 2013

COMPARTILHO TEXTOS GENTILMENTE CEDIDOS PELO PROFESSOR CELSO ANTUNES PARA COLABORAR NA REFLEXÃO SOBRE ANÁLISE DA AVALIAÇÃO E APRENDIZADO




GLÓRIA

Extraordinária professora, grande avaliadora da aprendizagem de seus alunos.

Glória, professora em três escolas particulares de excelente padrão, como a maior parte das pessoas que conhecia adorava se avaliar. Não que fosse vaidosa, mas sabendo o valor de uma boa impressão, jamais saía de casa sem se cuidar diante do espelho, na seleção das roupas e no cuidado com calçados e tudo mais essencial a quem sempre foi elegante. Mais ainda, Glória não saia de casa sem avaliar se portas e janelas estavam trancadas, se os eletrodomésticos estavam desligados e não havia descuido das coisas no lugar que deveriam estar. Avaliava também seu automóvel, dirigia com cuidado avaliando manobras, caminhos e distâncias e, ao chegar à escola, avaliava sem nem mesmo perceber que avaliava seus diários de classe, seus livros e, é claro, seus colegas e suas amigas. Com não abria mão da importância de persistente e contínua avaliação, avaliava também seus alunos.

Nunca confundia “prova” com “avaliação”, pois sabia que a mesma era circunstancial e a avaliação atitude reflexiva, consciente e permanente. Mostrava a todos que não existe educação verdadeira que não se preocupa com o progresso de seus alunos e nesse sentido mostrava-se menos preocupada com resultados numéricos deste ou daquele e bem mais com sua evolução, ainda que lenta e progressiva, ao estudar, fazer tarefas, trabalhar em grupo, apresentar lições, enfim, participar plenamente das aulas. Orgulhava-se, sem qualquer presunção, de que não bastava ser boa professora, mas era essencial ser também uma professora completa e isso incluía avaliar continuamente e avaliar muito bem.

Para não esquecer todos os princípios de deveriam nortear a avaliação que fazia, criou algo como um acróstico, fazendo com que cada uma das cinco letras de seu primeiro nome a lembrasse dos critérios com que aferia, um a um, o progresso de seus alunos.

Por esse motivo, com a letra “G” de Glória destacava que toda avaliação deveria ser “Global” e, dessa forma, acompanhar os avanços ou recuos de cada aluno, seus interesses e suas motivações. Com a letra “L” esforçava-se muito para produzir uma avaliação “Libertadora”. Dizia sempre que “progredir é se libertar” e que não pode existir liberdade verdadeira para quem não cresce com os conteúdos conceituais que domina e os incorpora ao seu cotidiano, com as competências que na escola se aprendia para na vida exercer e para as habilidades com as quais se emoldura essas competências. Lembrava que as competências essenciais eram “saber fazer, decidir e resolver” e que estas requeriam habilidades que davam qualidade e requinte a esses verbos.

Com terceira letra de seu nome “O” Glória buscava sempre que seus critérios de avaliação fossem “Otimistas” e, por isso mesmo, buscava em todas as linguagens de seus alunos a sua prosperidade, verdadeiramente “garimpava” em suas ações nos textos, nos discursos, nas aulas, nas provas e nas lições a sempre almejada evolução. Sabia que uma avaliação Global, Libertadora e Otimista inevitavelmente desembocaria em uma avaliação “Reveladora” dessa forma contemplando a quarta letra do seu nome. Uma avaliação com essa essência buscava pontos fracos para mudar, falhas ainda que pequenas para aprimorar. Um cuidado que Glória jamais omitia era que seus alunos pudessem dispor de avaliação “Integradora” e assim olhava com cuidado a diversidade culturas da classe, a bagagem linguística que traziam e, sobretudo, sua situação de aluno novo ou antigo, integrado aos colegas ou em busca ansiosa dessa integração.

Glória jamais deixou de estudar o tema da avaliação e não havia artigo ou tese, livro ou ensaio que não buscasse procurando sempre associar cada descoberta às letras de seu acróstico. Sabia que sua avaliação era verdadeiramente “Apaziguadora” e, por isso, seus alunos a recebiam sem medo, anseio ou tensões, antes descobrindo em cada erro não a vergonha, mas a busca de acerto.

A única tristeza de Glória em seu lindo trabalho era perceber que em alguns de seus colegas a preocupação avaliadora se distanciava do cuidado pedagógico, acreditando apenas em provas e em resultados como se cada aluno representasse quase nada a mais que um bilhete de loteria.



VYGOTSKY E A SUTILEZA DO “MÁXIMO” E DO “ÓTIMO”


O “máximo” é o maior de todos. Adjetivo que qualifica aquele que não tem rival. O “’ótimo”, bem mais modesto, representa apenas o muito bom, o melhor possível.

Se me perguntarem se prefiro uma lembrança que é o “máximo” ou uma que será “’ótima”, creio que ficarei com a primeira, pois uma ótima lembrança poderá se equiparar a outras lembranças ótimas, mas jamais chegará aos pés de uma lembrança que, sendo o máximo, será inigualável, aquela que jamais poderá admitir comparações.

Mas, se existe essa hierarquia entre esses adjetivos e na mesma o máximo sempre se colocará acima do ótimo, também existe entre eles uma diferença crucial: o “máximo” é de uso coletivo e se é o maior, sempre discriminará os demais, enquanto que por sua vez o “ótimo”, pode abrigar um sentido pessoal. Meu ótimo de apetite, ou de sono, não é igual ao seu, ainda que ambos sejam satisfatórios. Se um ditador maluco impusesse um apetite máximo, obrigatório a todos, faria com que muitos fossem obrigados a se empanturrar além da conta e outros passassem fome; afinal o máximo para um não necessita ser necessariamente o máximo para outro; mas as coisas se abrandariam caso se decretasse um “apetite ótimo”, pois nesse caso, cada um consumiria as efetivas necessidades de seu corpo.

Transpostas para a sala de aula e voltadas para a avaliação da aprendizagem, ainda uma vez os conceitos de “máximo” e de “ótimo” mostram realidades diferentes. Avaliar o desempenho dos alunos por um paradigma “máximo” significa estabelecer os limites que se deseja a todos, excluindo os que não o alcançarem. É esta a essência da avaliação somativa que se vê na maior parte das escolas do país. Nessas escolas, cada nota igual expressa valor igual e assim existem notas dos alunos bons e notas dos alunos fracos; existe a ingênua crença de que pessoas diferentes podem expressar resultados iguais. Prevalece a ideia de que existe um degrau que quem não o alcançou deve submeter-se ao reconhecimento de sua óbvia inferioridade.

Foi para muito além do reducionismo doentio dessa avaliação que caminhou Vygotsky. Ao mostrar que a verdadeira avaliação é aquela que se inspira no progresso efetivo de cada um e que este difere de um para outro, enfatizava que uma verdadeira aprendizagem deve buscar o ótimo, jamais o máximo, e que o “ótimo” de alguns não são necessariamente o ótimo de outros.

O “ótimo” que se busca na verdadeira aprendizagem conquistar é expressa pelo efetivo trajeto que o aluno conquistou, pela diferença entre onde chegaria sozinho, e até onde foi possível chegar pela intervenção do mestre.

Constituiu, entretanto, um erro acreditar que uma avaliação através de paradigmas “ótimos” constitua procedimento que envolva o “sistema” e, portanto, que não cabe a este ou aquele professor mudar, se o sistema não mudou. Essa visão representa preconceito colonialista, ideia retrógrada que admite que tudo que vem para mudar vem das autoridades constituídas, do poderoso “patrão”. Ora, o verdadeiro professor será sempre patrão de si mesmo e se acredita que é chegada a hora de livrar-se do preconceito retrógrado de avaliar através de conceitos máximos e mínimos, assumindo como Vygotsky um novo conceito de avaliação por paradigmas ótimos, jamais alguém será incapaz de impedi-lo e descobrirá o efetivo progresso de cada aluno, mesmo tendo que expressá-lo através de um número. Um professor que, em seus alunos, busca o ótimo, sabe de seus erros fazer desafios.


UM NOVO PARADIGMA PARA A AVALIAÇÃO


Uma avaliação coerente é sempre a ideia central em todo processo de mudança.

Se, por exemplo, meu objetivo é perder dois quilos em dez dias, somente posso saber se a meta foi alcançada ou o processo necessita ser corrigido, se disponho de uma boa balança. Mas, se a balança funciona para avaliação quantitativa e como ela funciona também para outras medidas o termômetro, barômetros, relógios ou uma fita métrica, torna-se bem mais difícil conceber um instrumento avaliador preciso, para explorar mudanças significativas na aprendizagem. Talvez, a única certeza que sobre esse tema se têm é de que não existe aprendizagem sem que exista uma transformação. Uma coisa é ser capaz de guardar por algum tempo, alguma informação na memória, outra coisa muito diferente é “aprender” e dessa forma deixar de ser a pessoa que se era e ser capaz de fazer desse novo saber, uma ferramenta para mais facilmente construir outros saberes. É, pois, no sentido de uma verdadeira e significativa aprendizagem, que se procura buscar um bom método avaliativo.
Celso Antunes e Luciane Sippert na Palestra "Novas Formas de
 Ensinar e  Novas Maneiras de Aprender", Humaitá - RS.

Talvez um caminho coerente para essa busca seja uma análise da evolução humana e a identificação de quais comportamentos desenvolvidos pela espécie, foram efetivamente significativos para sua transformação. A humanidade saiu das cavernas e hoje viagem pelo espaço, não porque isso estava programado em seus genes, mas porque desenvolveu procedimentos significativos que a fizeram evoluir. Dessa forma, sabendo quais são esses procedimentos e aplicando-os as diferentes inteligências humanas, talvez se possa chegar a um instrumento avaliativo se não perfeito, ao menos sem as aberrantes falhas de se dar nota às respostas dos alunos.

A primeira busca que se acredita pertinente para a criação desse instrumento é indagar, pois, quais procedimentos são e foram comprovadamente úteis para a evolução da humanidade. Um exame atento dos desafios enfrentados e dos resultados obtidos leva-nos assim a quatro ações que, naturalmente, podem ser desdobradas em muitas outras. Não se chegou onde estamos sem a capacidade de PLANEJAR, sem uma relativa RAPIDEZ para colocar em ação o planejamento e assim superar os inimigosuma VERSATILIDADE para ajustar os dois primeiros itens a nova e diferentes situações e para improvisá-lo quando ocorrência inusitada se abatia e, finalmente, sem uma necessária COOPERAÇÃO entre os membros da espécie. Essa ideia abarca a descoberta de soluções para problemas, a lógica dessa solução, a harmonia para perpetuar essa conquista e a certeza de que a força coletiva é sempre imensa quando canalizada a um mesmo objetivo.

Toda a essência que Darwin nos propõe se sintetiza nessas ações, mas a sofisticação da linguagem que viver no mundo de agora nos impõe, admite que essas ações possam distribuir-se pelas diferentes inteligências humanas. A capacidade de planejar um texto, uma palestra, uma aula ou uma excelente argumentação jurídica, por exemplo, não significa competências similares à de se planejar a construção de uma casa ou a fabricação de um foguete e por isso, essas ações necessitam se refletir as inteligências LINGÜISTICA, MATEMÁTICA, LÓGICA, ESPACIAL, SONORA, SINESTÉSICA, NATURALISTA E PESSOAL.

Se, agora pensarmos uma sala de aula convencional e um aluno que, independente da série que frequenta, necessita ser avaliado de forma coerente, pois se ali está, está para que se apure como pode se transformar, transformando o mundo, basta cruzar ações e inteligências e se aferir seu efetivo potencial. Por exemplo: Guilherme encontra-se acima da média de seus colegas na capacidade de planejar, no poder de transformar seus planos em projetos, na sutileza em adaptá-los e na busca de companheirismo para colocá-lo na realidade através de uma expressão linguística, e Luciana pode tanto quanto Guilherme através de uma expressão corporal. Conclusão: Guilherme e Luciana são alunos acima da média e estão prontos para evoluir. É irrelevante para Guilherme, a competência espacial, pois para isso ele pode contar com Luciana, e é irrelevante para Luciana a competência linguística. Afinal de contas, ambos descobriram a força da cooperação.
                                          

PLANEJAMENTO
RAPIDEZ
VERSATILIDADE
SOLIDARIEDADE
LINGUÍSTICA




LOGICA




MATEMÁTICA




ESPACIAL




SINESTÉSICA




SONORA




NATURALISTA




PESSSOAIS





AC – ACIMA DA MÉDIA / MC – MÉDIA DA CLASSE / ABAIXO DA MÉDIA

Diante desta referência, cabe uma questão: Como se enquadrar nessas referências os saberes escolares, os conteúdos explícitos de cada disciplina?

É evidente que toda ação requer informação. Sem a mesma, é impossível manifestá-la. Desta forma, todos os conteúdos apresentados aos alunos o seriam sobre a forma de situações problemas multidisciplinares, para que pudessem municiados por essa informação, colocar em ação as suas quatro competências e suas diferentes inteligências.


Autoria: Celso Antunes